segunda-feira, 21 de junho de 2010

[Crônica] "Sigamos, sempre..."

Era verão, e o sol se mostrava mais belo e radiante que nunca, quando Lilian Craig, 35 anos, me ligou e disse estar disposta a contar sobre sua experiência no dia 11 de setembro de 2001, nove anos após os atentados. Fiquei empolgado. E, na quinta-feira, dia marcado por Lilian para o nosso encontro, cheguei a sua casa às 8 horas da manhã, e esperei ansiosamente que ela saísse no portão.

Quando apareceu, estava usando um longo vestido azul marinho, casaco preto de malha fina, e uma sandália branca aberta dos lados. Ainda de longe, pude notar no rosto de Lilian uma cicatriz que cortava desde seu olho esquerdo, até seu queixo. Ao se aproximar de mim, observei que ela havia jogado o cabelo na frente do rosto, na tentativa de esconder o que jamais se apagaria de sua face. Esbanjando gentileza e simpatia, ela me chamou para caminhar em um pequeno bosque perto de sua casa, para que pudéssemos admirar as árvores, e tentar fazer aquele momento ser menos doloroso. Sentamos em um banco no meio de todas aquelas árvores com flores de várias cores, e ali ela começou.

Lilian detalhou o seu dia com uma firmeza e emoção incríveis. Começou do momento em que deixou a filha de 5 anos na escola – “Olhei para aquele rosto angelical, lhe dei um beijo estalado na bochecha, e um abraço que amassou todo o seu uniforme azul marinho” –, e seguiu até o momento em que foi atingida por uma bola de fogo enorme que caiu do alto das torres – “Não consegui pensar em nada. Só senti meus braços, pernas e rosto queimarem. Meu corpo se encobriu de poeira, e meus membros ardiam cada vez mais. Quando conseguiram me ajudar, baixei a cabeça lentamente e chorei. Meus braços estavam em carne viva”.

Após detalhar todo aquele dia de terror pelo qual ela passou, Lilian relembrou os cinco meses em que permaneceu internada no hospital New York-Presbyterian, onde teve que se recuperar da fratura que sofreu no fêmur e das queimaduras que tomaram 70% de seu corpo. “Mesmo estando internada, não deixei de pensar naquelas pessoas. Que sofrimento elas estavam passando. Fiquei acompanhando tudo por uma tevê que ficava no quarto em que eu me encontrava. Passava noites sem dormir, chorando”.

Hoje Lilian possui várias cicatrizes impossíveis de serem revertidas, até com o uso do laser, mas não perdeu a auto-estima e leva uma vida normal e cheia de milagres como ela mesma confirma. “Estar aqui no mundo, hoje, já é um milagre. Poder ver minha filha crescer é outro maior ainda. Minha vida é normal, e meu marido tem sido minhas mãos e pernas. Eu agradeço muita a Deus por não ter estado no alto daquelas torres, e ter tido que pular como muita gente fez”, diz emocionada e em lágrimas.

Ao terminar de ouvir tudo aquilo através daquela voz trêmula, por causa do choro quase incontido, não consegui mais lhe perguntar nada e decidi encerrar ali mesmo aquela tortura. Dei-lhe o mais forte abraço que consegui, agradeci e me desculpei por tê-la feito lembrar o dia 11 de setembro de 2001. Virei as costas e segui. Quando eu já tinha tomado certa distância do banco, ela grita com a voz forte e segura: “Sigamos. Sigamos, sempre...".


Por Sayonara Rodrigues.

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