terça-feira, 29 de junho de 2010

Entrevista com a jornalista Yvone Ridley

.....Abaixo, segue a entrevista publicada no site “Observatório da Imprensa” em 18 de setembro de 2002 com a jornalista inglesa Yvone Ridley. 

Foto: Divulgação
....Na época em que trabalhava para o jornal inglês Daily Express, Yvone entrou clandestinamente no Afeganistão e foi sequestrada sob acusação de ser espiã dos Estados Unidos. Depois de 11 dias como refém a jornalista converteu-se ao islamismo.


"Jornalista britânica detida pelo Taleban se converte ao islã", copyright Folha de S. Paulo, 11/09/02 (Por Paulo Daniel Farah)



"A jornalista britânica Yvonne Ridley, 44, que ficou detida no Afeganistão de 28 de setembro a 8 de outubro por ter entrado no país sem permissão do grupo extremista islâmico Taleban, converteu-se ao islamismo.
Ridley, que voltou ao Afeganistão duas vezes após a libertação, critica a guerra antiterrorismo e o provável ataque ao Iraque.

A seguir, trechos da entrevista que concedeu à Folha, por telefone, de Londres.

Folha - Cogitou-se a possibilidade de que a síndrome de Estocolmo [em que o sequestrado manifesta simpatia pelo captor] tenha levado a sra. à conversão ao islamismo...
Yvonne Ridley - Não é verdade. No sexto dia da detenção, um líder religioso me visitou. Quis saber se eu gostaria de me converter [Ridley era protestante]. Pensei que, se dissesse ‘sim’, acusariam-me de oportunismo. Se dissesse ‘não’, de insultar o islã e me apedrejariam. Argumentei que não podia mudar tanto minha vida na prisão. Disse que, se me libertassem, estudaria mais sobre o islã. Depois de solta, o que começou como um exercício puramente acadêmico transformou-se em uma viagem espiritual. Na verdade, gostaria de saber naquela época o que sei hoje porque eu perguntaria por que eles tratavam as mulheres tão mal. Aquilo não tinha nada a ver com o islã.

Folha - O que a atraiu no islã?
Ridley - Uma série de fatores. Comecei a ler sobre o islã e sobre a crença geral de que as mulheres são subjugadas. O Alcorão deixa bem claro que as mulheres são iguais aos homens. Foi uma surpresa. Fui a centros islâmicos e fiquei impressionada com as irmãs. Houve uma campanha de desinformação sobre o islã desde as cruzadas. Dizem que é violento, mas não é verdade. Inspirou muitos estudiosos, poetas e artistas.

Folha - Em geral, como as pessoas reagem à sua decisão?
Ridley - Amigos e familiares, em sua maioria, ignoraram minha decisão e fingiram que nada mudou. Não querem nem falar sobre o assunto. Algumas pessoas me ridicularizaram e outras me deram bastante apoio. Uma de minhas melhores amigas, que é judia, deu-me muita força.

Folha - A sra. entrou no Afeganistão usando uma burca [roupa afegã que cobre o corpo todo’. Qual a sua opinião sobre uso obrigatório da burca e sobre o Taleban?
Ridley - A burca é usada há séculos por razões culturais. O Taleban tornou seu uso obrigatório, mas não há nada no Alcorão sobre essa roupa.

Folha - Quantas vezes a sra. voltou ao Afeganistão desde sua libertação? O que mudou lá?
Ridley - Fui duas vezes. Quando o Taleban estava no controle, havia leis, apesar de absurdas. Hoje, o país está em caos. As mulheres continuam a usar a burca e ainda não têm a mesma voz que os homens. Por exemplo, no mês passado abriram uma piscina pública apenas para homens e garotos.

Folha - Como está a reconstrução do país?
Ridley - Os EUA são muito bons em fazer guerras, mas não em consertar o estrago. O Exército ainda está lutando essa guerra ridícula contra o terrorismo, mas os EUA não participam das forças de paz. Ninguém sabe onde está Bin Laden, o mulá Omar. O que essa guerra conseguiu até agora?
Os norte-americanos ainda sentem uma dor profunda. Muitos nem podem enterrar as pessoas que perderam nos atentados, mas o governo deveria questionar por que isso ocorreu. Inocentes não devem pagar pela política externa dos EUA. As atrocidades israelenses contra os palestinos são ignoradas, e sinto-me revoltada com a situação em Guantánamo. Se eu tivesse sido detida, espancada e colocada em uma jaula, seria um ultraje. Essas pessoas ainda precisam ser julgadas e não têm direito a advogado. Temos sete cidadãos britânicos lá.

Folha - Em seu livro ‘In the Hands of Taleban’ (nas mãos do Taleban), a sra. diz que a CIA tentou matá-la ou incentivou o Taleban a fazer isso. Por quê? A sra. tem provas?
Ridley - Quando fui sequestrada, havia muito apoio para a guerra no Afeganistão. Os EUA precisavam contrapor os que se opunham à guerra. Se eu tivesse sido morta pelo regime afegão, isso teria ajudado a começar rapidamente a guerra e a silenciar os críticos. Foi um presente divino para eles quando uma mãe branca e ocidental, com uma filha de nove anos, foi sequestrada. O Taleban recebeu um arquivo que informava que eu era uma espiã, por iniciativa do serviço secreto dos EUA e do Mossad [serviço secreto israelense’. Quando voltei para casa, descobri que meu apartamento havia sido vasculhado.

Folha - Qual sua opinião sobre a teoria do choque de civilizações, do professor Samuel Huntington?
Ridley - É ridículo falar em uma civilização judaico-cristã de um lado e de uma ‘não-civilização’ islâmica, ameaçadora, do outro. Os EUA são uma superpotência que busca um controle total sobre o mundo. Nosso premiê, Tony Blair, cada dia parece mais o poodle de George W. Bush.

Folha - Qual sua opinião sobre o provável ataque contra o Iraque?
Ridley - Sabemos que, quando os norte-americanos vão à guerra, vão a 30 mil pés de altura. Esse tipo de guerra só prejudica os civis."



Postado por Anne Nascimento


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